Em 2001, o pai do Sr. Ivair, que já produzia queijos na Serra da Canastra emprestou um terreno para que o filho também tivesse sua produção. Foram cinco anos de muito trabalho, até que o sogro o presenteasse com um terreno. Foi ai que Ivair, com o apoio da esposa Lúcia, começasse a realizar o sonho de ter seu próprio sítio.
Há sonhos que custam caro, e o deles necessitou de um empréstimo para acontecer. Dinheiro para o material em mãos, toda a família pôs mãos à obra. Literalmente. Pai, sogro, amigos… Cada um ajudando como podia. Construíram a primeira queijaria.
O primeiro tropeço
Eles produziam, mas o queijo não tinha tanta saída. As filhas e a esposa foram para a cidade, onde Lúcia costurava para fora. Sozinho no sítio, Ivair se isolava e aumentava a dificuldade em se relacionar com os outros. Nessa época, uma hérnia resolveu fazer-lhe companhia. Eram dias de cama, sem produzir, sem qualidade de vida. Em 2012 foi preciso deixar o sonho de lado. Vendeu as vacas e fechou o sítio. E foi para a cidade de São Roque, auxiliar a esposa a montar uma confecção.
Um novo começo
Ao iniciar a preparação para montar a confecção, a Associação Comercial convidou os então candidatos a empresários a participar do Empretec, um seminário comportamental oferecido pelo Sebrae Minas.
Desanimado e abatido, Ivair não queria sequer sair de casa, mas Lúcia se mostrou fundamental. Fez a inscrição dos dois e convenceu o marido a participar da seleção. Ambos foram aprovados, mas ela decidiu que ele faria o curso naquele momento.
O Empretec dura uma semana. São dias intensos de treinamento, incluindo tarefas que os participantes levam para desenvolver fora da sala de aula. Ivair sofria. Achava que estava vivendo os piores dias de sua vida. Contou com a ajuda da esposa e das filhas para as tarefas. Mas mais que isso “foram elas que não me deixaram desistir.”
Energia e motivação
O mesmo Ivair que na segunda era cabisbaixo e pouco confiante, terminou o seminário dando piruetas. Isto porque conseguiu a pontuação necessária para concluir o Empretec com sucesso. A filha Ângela lembra: “Depois do Seminário, houve uma mudança muito grande. Ele se dispôs a sair mais, voltou mais motivado, com mais energia e mais extrovertido. Passou a conversar mais. Interagir se tornou mais fácil porque a autoestima foi alavancada. Parecia outra pessoa.”
O novo Ivair uniu-se a Lúcia e montou a confecção. Fez cursos técnicos para ajudar na gestão. Trabalhou um ano e meio na empresa e decidiu que era hora de retomar o sítio.
Começar de novo
Ao decidir voltar para a roça, para trabalhar com o queijo, Ivair já sabia que precisava fazer diferente. Filiou-se à Associação dos Produtores de Queijo Canastra (APROCAN). As reuniões na associação foram fundamentais para rever técnicas e fazer parceiros. Percebeu que sua estrutura precisava melhorar. Caso contrário, não conseguiria crescer.
Novo empréstimo para nova queijaria. E novos problemas: as contas não fechavam. Mesmo com a esposa enviando dinheiro da confecção, a situação piorava. Na fase de construção, a sala de fabricação estava pronta. Mas não tinha como construir a sala de maturação, por falta de capital.
Ivair encarou a necessidade de pedir socorro. Em uma reunião da associação, disse aos colegas que estava há um passo de fechar as portas. Um dos produtores se disponibilizou a visitar o sítio, provar o queijo e ver como poderia ajudar. Era Guilherme Ferreira, outro produtor da região, do Queijo Capim Canastra, hoje ganhador de prêmios internacionais com seus produtos. Guilherme provou, gostou e comprou. Começou a pagar por peça o dobro do que Ivair conseguia com revendedores. Indicou Ivair para eventos e divulgou o queijo para os amigos. Ajudou com um empréstimo que foi pago aos poucos, às vezes com dinheiro, às vezes com queijo.
Mais um tropeço
A nova queijaria finalmente ficou pronta! Mas ainda havia obstáculos a vencer.
No início, o queijo não se adaptou ao novo local. No processo de “cura” o queijo não ficava bom. As bactérias boas não sobreviverem à química de tinta fresca e cimento. Ele ficava inchado e foi tomada a decisão de não vender, por falta de qualidade. Com a lacuna na entrega, perderam os clientes.
Foram 3 meses e 20 dias sem produzir queijo de qualidade. Prejuízos da ordem de R$ 15 mil. Essa foi a fase em que Lúcia e Ivair pensaram em desistir. “Foi a fase mais difícil: não havia clientes, e a queijaria estava recém construída. Deixamos de ganhar dinheiro que daria para quitar uma boa parte dos gastos que tivemos na queijaria”, lembra Lúcia.
Vencida essa fase, voltaram a vender queijo de qualidade, que tem melhor lucratividade e os enche de orgulho.
Ah, esses fungos!
Após 2 meses, os queijos começaram a ficar mais esbranquiçados. Por conta dos fungos. Ivair pedia à Lúcia que lavasse queijo por queijo. Tentando manter o produto como era antes. Lúcia dizia que deviam tentar deixar maturar um pouco mais, que aquela nova cobertura era boa. O mesmo dizia o amigo Guilherme, que continuava comprando e divulgando o queijo do Ivair.
Mas o produtor estava irredutível. Não queria a mudança. Lúcia (sempre atenta!) escondeu algumas peças. Tempos depois, em nova visita de Guilherme, resgatou o queijo e ofereceu aos dois. Ivair não teve como resistir. O produto era bom. E diferenciado.
Espaço para todos
Segundo Ivair, “O bom da Canastra é que cada queijo tem um gosto diferente. Não me preocupo com concorrentes. Somos todos parceiros. Sempre dizemos isso aqui. Porque há espaço para todos. Isso é fantástico. A região ajuda. São tantas coisas que ajudam a dar sabor ao queijo: o tipo de gado, o que ele come, a forma de fazer o queijo. Hoje tenho queijos em idades e maturações diferentes. De 15 dias a 18 meses de maturação. O que o Guilherme fez comigo, eu tento fazer por novos queijeiros. O cooperativismo é forte em nossa cidade e nós nos ajudamos. “
Vida longa a esse jeito mineiro de persistir e ganhar espaço aos poucos.
Lições do queijo canastra
- A boa ideia funciona melhor quando planejada
É importante planejar o uso do dinheiro, sobretudo quando é fruto de empréstimos. Avalie também o tempo necessário para voltar a lucrar. Pode ser que seja necessário aumentar um pouco o valor pedido, para manter as contas em dia. Diminua o risco planejando seus investimentos.
- Bons parceiros encurtam o caminho até o sucesso
É preciso pensar em quais são as instituições ou pessoas que podem agregar valor ao seu negócio. Além do Guilherme, Ivair contou com o apoio da APROCAN. A associação permitiu relacionamentos com outros produtores. E ainda ajudou nos processos de legalização e na busca por registros exigidos pelo IMA e pelo MAPA.
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Manual – Cultura da cooperação